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Uma tendência de negócio chamada trancismo

Cada vez mais popular no país, as tranças enaltecem a beleza negra e movimentam a economia

22.09.22 - 09H27 Por camillalima
Nathália Arruda apostou no trancismo como ideia de negócio/ Foto: Tainá Cavalcante

Foi-se o tempo que a cacheada Myllena Nardes, 24, ia ao salão de beleza só pra cortar ou hidratar os cabelos. Desde que descobriu o poder do trançado, a técnica de Enfermagem aposta na versatilidade e na potência dos penteados, que enaltecem a beleza da mulher preta: “Eu tento fazer algum tipo de trança todo mês, porque quando eu faço minha autoestima vai lá em cima, fora que é muito prático também, você já acorda, se olha no espelho e diz: – acordei pronta e linda pra passar o dia”, brinca.

Mas pra isso, a Myllena põe a mão no bolso: “Os gastos sempre variam com os tipos, vai de R$ 100 até uns R$ 400, então sempre que sobra algum dinheirinho eu vou lá e faço”, conta. E são horas sentada numa cadeira para sair com o resultado almejado. Ao lado, de pé, está Nathália Arruda, 24, do Estúdio Pró Afro, que chega a passar até 14h trançando cabelos: “Por que não é só chegar no salão e fazer cabelo, é fazer a organização, limpeza, tudo. Por dia, cada trancista aqui consegue atender até 2 clientes, dependendo muito do tipo de trança. Temos hora pra entrar, mas não temos pra sair, depende da demanda dos clientes, dos cabelos. Então são até 14h em pé, e no outro dia é acordar cedo pra estar no mesmo pique de novo”, enfatiza a empreendedora.

É um trabalho árduo, cansativo, mas que vem ganhando cada vez mais adeptos, tanto de novos – e empolgados – clientes, como também de empreendedores, que tem enxergado a potência desse mercado. No Brasil, 70% das brasileiras têm cabelos crespos ou cacheados. Mulheres que, assim como a Myllena, vêm investindo cada vez mais em produtos e serviços específicos para seus tipos de cabelo. Um mercado promissor que só cresce, não à toa, as mulheres negras movimentam R$700 bilhões em negócios anuais, segundo dados do Sebrae.

Nesse mercado, um dos segmentos que vem se destacando é o do trancismo. E foi nessa área que, em 2020, a jovem empreendedora Nathália, decidiu apostar. O negócio, que começou na sala de casa, depois se transformou num espaço colaborativo, no bairro Bonsucesso, recentemente ganhou novo endereço. A ideia de levar o Estúdio Pró Afro para o coração do bairro Aldeota foi de ampliar ainda mais o público, que procura o salão em busca de liberdade: “liberdade dos processos químicos de alisamento, relaxamento, que fazem por anos, às vezes, desde criança. Muitas mulheres chegam no meu salão, muitas vezes, sem nem lembrar qual é a textura real do cabelo, não sabem nem como é o seu cacho. Então são mulheres que chegam até mim cansadas e resolvem passar pela transição, e usam as tranças para passar por esse processo”, explica Nathália sobre o público-alvo do seu Estúdio.

Ela explica porém que para investir no segmento é preciso vencer muitos desafios: “ Por que, apesar de termos evoluído muito, enquanto sociedade ainda não chegamos lá. Então ainda se encontra muito resistência, muito preconceito. O meu salão, que é especializado em tranças, apesar de as tranças ter se popularizado muito de uns anos pra cá, as pessoas ainda estranham. Os principais desafios é estar nesse lugar, ser uma mulher negra e encontrar muitas, muitas, muitas pessoas que ainda não levam tão a sério o nosso trabalho”, relata.

Apesar disso, a procura pelo serviço só aumentou. Tanto que hoje, a Nathália incorporou ao seu negócio cursos para formar outras trancistas para atender a uma demanda que promete ser cada vez maior. Mas para muito além de agregar valor a marca, os cursos atendem também ao social, hoje o Estúdio Pró Agro já oferece bolsas de até 100%: “eu sempre tive um anseio muito grande de conseguir de alguma forma usar o trancismo para alcançar mulheres como eu, que estavam perdidas e sem renda, sem visão de futuro pra vida. Ajudar mulheres como eu a sair desse lugar, se ver de outra forma. Então eu sempre quis ensinar o que eu aprendi “na marra”, queria facilitar a vida de outras mulheres”.

Para a empreendedora, o importante para quem está chegando e pretende investir nesse segmento é nunca deixar de se aprimorar, principalmente num segmento que vive das tendências: “Eu sempre repito para as minhas alunas sobre a importância de nunca deixar de treinar, mesmo que você seja uma trancista e que tenha três, quatro, cinco, dez anos de carreira, nunca pode deixar de treinar e de olhar para a frente, para as novas tendências, e estar sempre estudando”, afirma.

Para o futuro, Nathália tem ainda grandes planos: “Meus planos para o futuro é dominar o mundo, e eu sempre falo isso porque é assim que a gente tem que pensar (risos). Para um futuro mais próximo, eu pretendo focar cada vez mais nos cursos. Estou agora buscando parcerias com órgãos públicos para tornar ainda mais acessível a formação de novas trancistas, além de expandir nossa marca em Fortaleza e, quem sabe, até em outras cidades”. 

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